Raízes da desigualdade brasileira à luz da interpretação de Sérgio Buarque
dc.citation.issue | VI | pt_BR |
dc.creator | Almeida, Fernanda Maria Brito Gonçalves | |
dc.creator | UCSAL, Universidade Católica do Salvador | |
dc.date.accessioned | 2020-10-19T19:45:15Z | |
dc.date.available | 2020-10-19 | |
dc.date.available | 2020-10-19T19:45:15Z | |
dc.date.issued | 2003-10 | |
dc.description.resumo | A pesquisa A Família de Maria Ninguém, ora em andamento no Programa de Pós- Graduação em Educação da Universidade Federal da Bahia, centra-se na análise de papéis e representações político-sociais, desempenhadas ou atribuídas à família feminina da pobreza brasileira. Dadas as condições e características do processo que coloniza o Brasil, a mulher exerce papel importante na produção e reprodução dos bens – além da sua função imediata, a de gerar. Em virtude da mobilização masculina pelo território a ser conquistado, é atribuída à mulher a responsabilidade da condição de chefe de família recorrentemente. Não obstante o peso dessas atribuições e funções, a imagem da mulher – e mesmo de sua prole – aparece em negativo freqüentemente, cabendo-lhe sempre responder às cobranças de uma condução de “vida santa” e ao ônus da prova da sua “honestidade”. Isso se dá em virtude das regras que regem a ordem colonial, centradas na moral cristã e na organização social estamental. Esta última, reflexo do patrimonialismo político-econômico que, em sua gênese, é repercutido em formas político-sociais autoritárias, e – no plano micro-sociológico da família – no patriarcalismo. Muitos dos atributos negativos plantados naquela época continuam a ser reproduzidos até a contemporaneidade, mantendo-se um ordenamento autoritário, reconfigurando o patrimonialismo e o patriarcalismo designantes, mantenedores e justificadores das desigualdades sociais. O princípio de hierarquia nunca chegou a importar de modo cabal, entre nós. Toda hierarquia funda-se necessariamente em privilégios. E a verdade é que, bem antes de triunfarem no mundo as chamadas idéias revolucionárias, portugueses e espanhóis parecem ter sentido vivamente a irracionalidade específica, a injustiça social de certos privilégios, sobretudo dos privilégios hereditários. O prestígio pessoal, independente do nome herdado, manteve-se continuamente nas épocas mais gloriosas da história das nações ibéricas. O livro Raízes do Brasil (BUARQUE DE HOLLANDA, 1936) é uma obra essencial à análise da fundação da brasilidade, e nesta, da divisão dos espaços sociais, até daqueles mais estreitos. Trata-se de uma narrativa tensa. Essa tensão se revela pelo rompimento que efetua com as velhas visões deterministas dos autores que o antecedem em estudos dessa natureza, inaugurando a percepção dialética no processo analítico. É tenso, além disso, porque, com esse procedimento, instaura a reflexão sobre a dinâmica dos antagonismos sócio-políticos, sempre presentes na formação brasileira, embora quase sempre negados, a fim de que as resistências não apareçam, restringindo-lhes a importância. Velho jogo das elites oligárquicas: ao mesmo tempo em que restringem a participação – inclusive pelo uso de mecanismos impeditivos de acesso à palavra – reduzem ao mínimo as manifestações, e aquelas que escapolem aos meios de controle, são obnubiladas, condenadas ao esquecimento, a fim de que a ordem não seja questionada. Tenso, ainda, porque revela a distância entre Estado e comunidade; a apropriação daquele pelas elites conservadoras, configurando o fenômeno do patrimonialismo, tão bem analisado por Faoro (1958). Finalmente, tenso, na medida em que percebe que a saída possível rumo à democracia viria das camadas populares, sobretudo do povo que habita o meio urbano, desde quando fosse possível vencer os impasses históricos, que parecem mergulhar a sociedade brasileira na estagnação, graças à sobrevivência das relações sociais construídas na Colonização e reconstituídas segundo a dinâmica das organizações arcaicas rurais. Mais proximamente, as relações reproduzem a configuração inicial do poder no Brasil. Já no século XV, dá-se a centralização do estado em Portugal, que concede benesses econômicas e políticas a uma burguesia, também prematuramente constituída, estabelecendo as origens do patrimonialismo. Nesse sentido, o patrimonialismo português, e sua versão brasileira, permitem a privatização de parcelas do Estado a grupos, constituindo o que Faoro (2000), mais tarde, designaria como compondo o estamento privilegiado – objeto e sujeito do poder estatal –, enquanto determina às demais camadas os papéis de subalternidade, de condição de força de trabalho e de ausência de participação no jogo de força político. O enraizamento desses pressupostos dificultaria a experiência do Estado consolidado e o exercício de leis gerais, aos quais todos se submetessem, ao mesmo tempo em que seriam protegidos igualmente. Pelo contrário, o patrimonialismo se estruturando, alimenta a reprodução da experiência oligárquica, ao mesmo tempo em que reconstrói e estende o alijamento de muitas das redes de proteção estatal e legal. O que representaria o fenômeno seria o conceito cunhado por Buarque (2002) do brasileiro como “homem cordial”. A “cordialidade” não seria aquela costumeiramente associativa das relações sociais dóceis ou civilizadas. Na verdade, constituiria a representação de um processo histórico de recriação de mentalidades, pelas quais os bens e instituições públicas são considerados extensões da família patriarcal oligárquica – devendo ser tratados a partir do âmbito (e dos interesses) domésticos. Introduzindo Buarque, Antônio Cândido define esse estado de cordialidade como: O “homem cordial” não pressupõe bondade, mas somente o predomínio dos comportamentos de aparência afetiva, inclusive suas manifestações externas, não necessariamente sinceras nem profundas, que se opõem aos ritualismos de polidez. O “homem cordial” é visceralmente inadequado às relações impessoais que decorrem da posição e da função do indivíduo, e não da sua marca pessoal e familiar, das afinidades nascidas na intimidade dos grupos primários (BUARQUE, 2002: 938; grifos meus). As tendências de “familiaridade”, naturalmente, se estendem às instituições sociais, inclusive facilitando sua privatização, desenhando espaços sócio-políticos, segundo essa ótica. Certamente aos membros das camadas populares são designados os espaços menos latos e visíveis, e mesmo, os não-lugares. Dados os referenciais desse patrimonialismo e seus reflexos patriarcalistas, às mulheres da pobreza estão reservados âmbitos ainda mais sombrios. Conferir suas dimensões originais e suas reconfigurações ao longo da História Social brasileira é o móvel maior do processo analítico da pesquisa A Família de Maria Ninguém. | pt_BR |
dc.identifier.isbn | 85-88480-18-12 | |
dc.identifier.issn | 85-88480-18-12 | pt_BR |
dc.identifier.uri | https://ri.ucsal.br/handle/prefix/1879 | |
dc.language | por | pt_BR |
dc.publisher | Universidade Católica do Salvador | pt_BR |
dc.publisher.country | Brasil | pt_BR |
dc.publisher.initials | UCSAL | pt_BR |
dc.relation.ispartof | SEMOC - Semana de Mobilização Científica- Raízes da desigualdade brasileira à luz da interpretação de Sérgio Buarque | pt_BR |
dc.rights | Acesso Aberto | pt_BR |
dc.subject | Desigualdade | pt_BR |
dc.subject | SEMOC - Semana de Mobilização Científica | pt_BR |
dc.subject.cnpq | Sociais e Humanidades | pt_BR |
dc.subject.cnpq | Multidisciplinar | pt_BR |
dc.title | Raízes da desigualdade brasileira à luz da interpretação de Sérgio Buarque | pt_BR |
dc.title.alternative | SEMOC - Semana de Mobilização Científica | pt_BR |
dc.type | Artigo de Evento | pt_BR |
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