O doido criminoso contra o resto do mundo: um estudo sobre a legalidade da internação cautelar no Hospital de Custódia e Tratamento de Salvador - Ba
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Date
2024-11-29
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Publisher
UCSal, Universidade Católica do Salvador
Abstract
A pesquisa analisou a legalidade da manutenção de internações cautelares provisórias de réus considerados (ou com suspeita de serem) inimputáveis, no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP) da Bahia, sob a perspectiva de possíveis violações de direitos no Estado da Bahia. Por meio do exame de decisões judiciais e laudos psiquiátricos, constatou-se que o uso recorrente da internação provisória, sem reavaliação periódica, configura um mecanismo de exclusão social, em afronta ao Código de Processo Penal (especialmente os arts. 282 e 319), à Lei 10.216/2001, ao Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) e a tratados internacionais de direitos humanos, como as Regras de Mandela e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU).
O estudo quantitativo e qualitativo revela que a carência de serviços de saúde mental na maioria dos municípios do interior da Bahia – boa parte sem Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) – fortalece a prática de manter os indivíduos em internação compulsória por tempo indeterminado. Essa realidade é agravada pela ausência de avaliações concretas de periculosidade e pela aplicação indiscriminada de medidas cautelares diversas da prisão, que, na prática, tornam-se uma forma de confinamento prolongado. Em tal cenário, o HCTP funciona como espaço de contenção em detrimento do cuidado e da reabilitação, reforçando padrões raciais e de classe que marginalizam grupos vulneráveis. A revisão da literatura, ancorada em teóricos como Erving Goffman (“instituição total”), Michel Foucault (“poder disciplinar”), Alessandro Baratta e Eugenio Raúl Zaffaroni, demonstrou como a internação compulsória prolongada reproduz um sistema de opressão, voltado ao controle social dos “indesejáveis”. Nesse sentido, o HCTP acaba por desrespeitar a própria finalidade terapêutica, tornando-se instrumento de segregação. A falta de um Projeto Terapêutico Singular (PTS) e de serviços comunitários contraria a Resolução 487/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Lei 10.216/2001, que preconizam a excepcionalidade da internação e a prioridade do cuidado em liberdade. Em conclusão, a tese sustenta que a manutenção de internações cautelares provisórias no HCTP da Bahia é ilegal e configura constrangimento ilegal, pois viola princípios constitucionais, disposições do Código de Processo Penal e tratados internacionais de direitos humanos. Defende-se, assim, a necessidade de revisão das decisões judiciais que impõem a internação sem fundamentação concreta, bem como o fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) como forma de assegurar tratamento adequado, evitando o uso abusivo e discriminatório da internação psiquiátrica. A superação desse modelo requer investimentos em saúde mental comunitária e políticas públicas inclusivas, em consonância com os valores constitucionais de dignidade da pessoa humana, autonomia e não discriminação.
Description
Keywords
Prisão cautelar, Internação provisória, Hospital de Custódia e Tratamento - Salvador, Reforma psiquiátrica, Sistema prisional, Saúde mental